quarta-feira, janeiro 15, 2020

PÉ DE PATA, MANGALÔ, TRÊS VEZES!

Minha avó tinha uma pata formosa, a mais linda e gorducha do quintal. De andar remado, matreira e empoderada, desfilava pelo terreiro como rainha da passarela. Dava gosto de ver a bichona gingar de bico erguido, passos de quem ensaia um voo que não decola nesse seu espaço soberano. - Essa jamais vai pra panela! - dizia minha vó, orgulhosa da mais bela obra de sua criação! 

A casa era de roça, vida sem muros, vizinhança que nem precisava de anúncio, foi assim que a dona entrou, cheia das conversas,
vontade de prosear e contar vantagens. Sabíamos da fama daquela peça: muito papo, muita marra e um desejo enorme por tudo que fazia a felicidade do outro - a tal da inveja, sabe o que é? Pois não tardou a botar os olhos gordos na pata e se encantar: que dama! Dali pra frente, travou uma luta inglória com minha vó pra que lhe vendesse a bicha. Muitas negativas depois, vencida definitivamente, lá se foi em total contrariedade. Exausta do embate, Vovó foi se refazer com um café quentinho, uma broa e a velha cadeira de descanso. 

Cochilou, acordou com os gritos dos netos: Vó, sua pata tá estrebuchando! Correu lá e nada pode fazer, a preferida deu o último suspiro e partiu num voo inesperado e final. De nada adiantaria qualquer figa de espantar o azar, em qualquer idioma ou crença, pé de pato, mangalô, livrai-nos do mal, amém! Essa história corre gerações na família crédula, dessa vez convencida pela evidência incontestável de que olho gordo mata pata, além de outros estragos...